Cildo Meireles: Artista conceitual brasileiro e pioneiro da instalação

Cildo Meireles: Artista conceitual brasileiro e pioneiro da instalação

Selena Mattei | 27 de set. de 2024 9 minutos lidos 0 comentários
 

Cildo Meireles, nascido no Rio de Janeiro em 1948, é uma figura de destaque na arte conceitual e de instalação brasileira. Conhecido por suas obras politicamente carregadas, Meireles frequentemente explora temas de resistência contra a ditadura militar do Brasil e a opressão sociopolítica mais ampla...


Cildo Meireles, nascido no Rio de Janeiro em 1948, é uma figura de destaque na arte conceitual e de instalação brasileira. Conhecido por suas obras politicamente carregadas, Meireles frequentemente explora temas de resistência contra a ditadura militar do Brasil e a opressão sociopolítica mais ampla. Suas instalações de grande escala, como Red Shift (1967–84) e Insertions Into Ideological Circuits (1970–76), incentivam o envolvimento profundo do espectador, frequentemente evocando uma resposta fenomenológica por meio da interação.

Biografia

Cildo Meireles (n. 1948) é um renomado artista conceitual e escultor brasileiro, reconhecido por suas instalações de grande porte que criticam a opressão política no Brasil. Seus trabalhos interativos incentivam o engajamento do público, tornando o espectador parte da experiência artística, frequentemente invocando uma resposta fenomenológica.

Nascido no Rio de Janeiro, Meireles demonstrou uma paixão precoce por desenho e relações espaciais. Quando criança, seus interesses criativos foram alimentados por seu pai, que trabalhava para o Serviço de Proteção ao Índio do Brasil. Esse papel levou a família a viajar extensivamente pelo Brasil rural, o que influenciou profundamente a percepção de Meireles sobre as culturas indígenas e sua marginalização na sociedade brasileira. Esses temas apareceram mais tarde em seu trabalho, como em Southern Cross (1969–70) e Olvido (1990). Um encontro na infância com um homem empobrecido que construiu uma pequena cabana na floresta impactou profundamente sua abordagem para fazer arte que poderia ser deixada para outros experimentarem.

Meireles iniciou seus estudos formais de arte na Fundação Cultural do Distrito Federal em Brasília em 1963. No final dos anos 1960, ele foi apresentado às obras de Hélio Oiticica e Lygia Clark, levando-o ao movimento Neoconcreto, que explorava a dissolução das fronteiras entre arte e vida. Seu despertar político veio durante uma manifestação contra a ditadura militar do Brasil em 1964, que mais tarde influenciou os temas politicamente carregados em sua arte.

Inicialmente focado em desenho, Meireles fez a transição para a arte de instalação em 1968, criando ambientes interativos que exploravam conceitos efêmeros. Seus primeiros trabalhos, como Virtual Spaces (1968), mergulharam na geometria espacial e na relação entre objetos e seus arredores.

Em resposta à censura do regime militar brasileiro, Meireles desenvolveu as Inserções em Circuitos Ideológicos (1970–1976), um projeto de arte subversivo onde ele imprimiu mensagens políticas em objetos cotidianos como garrafas de Coca-Cola e dinheiro. Isso permitiu que sua crítica ao capitalismo e ao autoritarismo se infiltrasse na vida cotidiana sem confronto direto. Embora seu trabalho permaneça politicamente carregado, ele evoluiu para ser mais sutil em suas críticas.
Meireles foi uma figura-chave na fundação da Unidade Experimental do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em 1969 e coeditou a revista de arte Malasartes em 1975. Ele recebeu vários prêmios de prestígio, incluindo o Prêmio Príncipe Claus em 1999 e o Prêmio Velázquez de Artes Plásticas em 2008.

Estilo, Movimento e Assuntos

Cildo Meireles é mais conhecido por suas contribuições à arte conceitual e de instalação. Ele foi fortemente influenciado pelo movimento neoconcretismo brasileiro, particularmente artistas como Hélio Oiticica e Lygia Clark, que se concentraram em experiências sensoriais e interação do espectador. O trabalho de Meireles frequentemente examina questões de poder, controle e ideologia, com temas recorrentes incluindo opressão, história colonial e a mercantilização da vida cotidiana.


Obras Famosas

Desvio para o vermelho (1967–1984)
Red Shift é uma instalação em grande escala composta por três salas, cada uma dominada por tons de vermelho. A peça faz referência tanto à aberração cromática quanto ao conceito de "shift" como um deslocamento ou desvio. A primeira sala, intitulada Impregnation , sobrecarrega os visitantes com objetos domésticos de cor vermelha, criando uma experiência visualmente saturada e desorientadora. A segunda sala, Spill/Environment , apresenta uma poça de tinta vermelha derramando de uma pequena garrafa, evocando pensamentos de sangue e inquietação. A sala final, Shift , contém uma pia inclinada com líquido vermelho derramando de uma torneira, reforçando a natureza inquietante da instalação. O uso generalizado do vermelho foi interpretado como um símbolo de violência e repressão política durante a ditadura militar do Brasil.

Cruzeiro do Sul (1969–1970)
Esta escultura minimalista, frequentemente chamada de "humiliminimalismo" por Meireles, é um pequeno cubo feito de dois tipos de madeira sagrada usada pelo povo Tupi do Brasil — pinho e carvalho. A escultura de 9 mm x 9 mm é repleta de significado simbólico, representando crenças indígenas e servindo como um aviso à sociedade moderna sobre as consequências de ignorar a natureza e a tradição. A escultura incorpora a memória e o significado cultural do povo Tupi, que foi marginalizado na sociedade brasileira.

Inserções em circuitos ideológicos (1970–1976)
Neste projeto politicamente carregado, Meireles usou objetos cotidianos, como garrafas de Coca-Cola e notas de banco, para desafiar ideologias capitalistas e imperialistas. Ao inserir sutilmente mensagens críticas nesses objetos, que já estavam em circulação, ele pretendia provocar a conscientização pública sobre o consumismo e a opressão política. Por exemplo, frases como "Quem matou Herzog?" foram impressas na moeda para questionar a violência do Estado.

Através de (1983–1989)
Through é uma instalação semelhante a um labirinto com oito toneladas de vidro quebrado, cordas de veludo e várias barreiras que criam um ambiente desafiador e desconfortável para os participantes. Os visitantes são convidados a caminhar através do vidro quebrado, aumentando sua consciência dos limites físicos e sensoriais. O conceito de labirinto se inspira nas obras do escritor Jorge Luis Borges e evoca sentimentos de desorientação e reflexão.

Babel (2001)
Em Babel , Meireles constrói uma estrutura imponente a partir de centenas de rádios, cada um sintonizado em diferentes estações transmitindo em vários idiomas. Essa cacofonia de sons faz alusão à história bíblica da Torre de Babel, que simboliza a fragmentação da comunicação humana. A instalação reflete sobre a futilidade de buscar uma linguagem universal em um mundo dividido por diferentes línguas, ao mesmo tempo em que comenta sobre a globalização e seu impacto na comunicação.

Exposições e o Mercado de Arte

Meireles considera que sua primeira exposição pública ocorreu em 1965, quando uma de suas pinturas e dois de seus desenhos foram exibidos no Segundo Salão Nacional de Arte Moderna, em Brasília.

Em 1999, uma grande retrospectiva de seu trabalho foi realizada no New Museum of Contemporary Art em Nova York. Esta exposição viajou mais tarde para o Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro e o Museu de Arte Moderna de São Paulo. Junto com a exposição, a Phaidon Press publicou um livro intitulado Cildo Meireles no mesmo ano.

A primeira grande exposição de seu trabalho no Reino Unido ocorreu na Tate Modern em outubro de 2008, marcando a primeira vez que um artista brasileiro foi homenageado com uma retrospectiva completa na Tate. Esta exposição mais tarde mudou-se para o Museu d'Art Contemporani em Barcelona e depois para o Museo Universitario Arte Contemporáneo (MUAC) na Cidade do México, onde ficou em exibição até janeiro de 2010.

De março a julho de 2014, o HangarBicocca de Milão sediou uma grande retrospectiva da obra de Meireles, exibindo doze de suas peças mais significativas. Outra retrospectiva notável, intitulada Entrevendo (Vislumbrando) , ocorreu no SESC Pompeia de setembro de 2019 a fevereiro de 2020, apresentando várias de suas importantes instalações e acompanhada por um catálogo detalhado da exposição.

A obra de Cildo Meireles foi exibida em um cenário internacional, com destaque em várias edições da Bienal de Veneza (37ª, 50ª, 51ª e 53ª) na Itália, bem como na Bienal de São Paulo (16ª, 20ª, 24ª e 29ª). Sua presença se estende à Bienal de Istambul na Turquia (6ª e 8ª edições), ao Festival Internacional de Arte de Lofoten na Noruega, à Bienal de Lyon na França (11ª e 14ª edições) e às estimadas exposições da Documenta na Alemanha (9ª e 11ª).

Em 2023, Meireles foi homenageado com o Prêmio Roswitha Haftmann, o prêmio mais distinto da Europa, marcando-o como o primeiro ganhador latino-americano em mais de duas décadas. Ao longo de sua ilustre carreira, ele também ganhou inúmeras outras honrarias nacionais e internacionais, incluindo o Prêmio Faz Diferença de O Globo em 2019, o Prêmio ABCA em 2015, o Prêmio Velázquez de Artes Visuais em Madri em 2008, o Prêmio APCA em 2007, um Doutorado Honorário em Belas Artes de São Francisco em 2005 e o título de Officier de l'Ordre des Arts et des Lettres em Paris em 2005, entre outros.

Meireles realizou exposições individuais em algumas das mais prestigiadas instituições artísticas do mundo. Exposições notáveis incluem Cildo Meireles no Museo de Arte Miguel Urrutia em Bogotá, Colômbia (2020); Entrevendo no SESC Pompéia em São Paulo (2019); Cildo Meireles: Instalações no Hangar Bicocca em Milão, Itália (2014); e mostras no Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofía em Madrid, Espanha (2013) e no Museu de Arte Contemporânea de Serralves no Porto, Portugal (2013-2014).

Seu trabalho também foi apresentado em retrospectivas significativas, como Cildo Meireles no MACBA em Barcelona e MUAC na Cidade do México (2009), Tate Modern em Londres (2008) e a Pinacoteca de São Paulo (2006). Além disso, suas exposições abrangeram instituições como Portikus im Leinwandhaus em Frankfurt (2004), Musée d'Art Moderne et Contemporain de Strasbourg na França (2003), MAM-SP e MAM Rio no Brasil (1999-2000) e o New Museum em Nova York (1999).

Nos últimos anos, Meireles participou de várias exposições coletivas influentes. Entre elas , Chosen Memories: Contemporary Latin American Art from the Patricia Phelps de Cisneros Gift and Beyond no MoMA em Nova York (2023), Utopias e Distopias no MAM-Bahia em Salvador (2022) e The Source na Fondation Carmignac em Hyères, França (2019).

Outras exposições coletivas notáveis incluem Conjuro de ríos no Museo de Arte de la Universidad Nacional de Colombia em Bogotá (2018), Avenida Paulista no MASP em São Paulo (2017) e Em Polvorosa no MAM-Rio no Rio de Janeiro (2016). Seu trabalho também foi incluído em Nous l'avons tant aimée, la révolution no Musée d'Art Contemporain de Marseille, França (2015) e na exposição municipal de arte contemporânea artevida na Casa França-Brasil no Rio de Janeiro (2014), entre outros.

As peças de Meireles são mantidas em inúmeras coleções públicas de destaque ao redor do mundo. Entre elas estão o Museu de Arte Moderna (MoMA) em Nova York, a Tate em Londres e o Stedelijk Museum voor Actuele Kunst em Gent, Bélgica. Seu trabalho também faz parte das coleções do Instituto Inhotim em Brumadinho, MG; MAC – Niterói; Museu de Arte Contemporânea do Século XXI em Kanazawa, Japão; Fundação Serralves no Porto, Portugal; MACBA em Barcelona, Espanha; Centre Georges Pompidou em Paris, França; Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía em Madri, Espanha; Museum für Moderne Kunst em Frankfurt, Alemanha; Los Angeles County Museum of Art (LACMA) nos EUA; Art Institute of Chicago; New Museum em Nova York; MASP e MAM-SP em São Paulo; MAM-Rio no Rio de Janeiro; e a Pinacoteca de São Paulo.

Influência em outros artistas

Meireles inspirou uma geração de artistas que se envolvem com arte conceitual e temas políticos. Seu uso de objetos cotidianos para desafiar normas sociais influenciou particularmente artistas latino-americanos que exploram temas de colonialismo, disparidade econômica e resistência. Seu foco na participação do espectador também abriu caminho para instalações de arte interativas e imersivas em todo o mundo.

Fatos pouco conhecidos

Um aspecto menos conhecido do trabalho de Meireles é sua exploração do som. Em muitas de suas instalações, o som desempenha um papel crucial na criação de um ambiente imersivo. Além disso, Meireles tem um fascínio por valor e mercantilização, o que é evidente em suas obras envolvendo moeda alterada, como as notas de Zero Dollar .



Cildo Meireles se destaca como uma figura pioneira na arte conceitual, com suas instalações politicamente carregadas oferecendo uma crítica poderosa de questões globais e locais. Sua habilidade de misturar engajamento sensorial com profundos comentários sociopolíticos continua a ressoar no mundo da arte contemporânea, fazendo dele uma figura vital na história da arte latino-americana e global.

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